Uma recomendação do Ministério Público Federal do Maranhão (MPF-MA) publicada na última sexta-feira (29), por meio da Procuradoria da República no estado, dá razão aos 8 vereadores que votaram contra o Decreto de Calamidade na Saúde Pública de Itapecuru Mirim enviado à câmara pelo prefeito Miguel Lauand.
O Parecer da Comissão Especial (Res. 05/2020), sobre o Decreto de Calamidade entrou em pauta para votação no plenário Hercílio do Lago Filho na última terça-feira (19) e foi rejeitado pelos parlamentares com maioria de 7 votos contra 3, o que causou muita polêmica na cidade. Além disso, a tentativa de crucificar os vereadores que votaram contra e de atribuir a eles alcunha de "inimigos da saúde de Itapecuru".
Nas explicações pessoais, todos os edis contrários ao parecer foram unânimes em afirmar que Decreto é uma ferramenta exclusiva do poder executivo. "Esta é uma prerrogativa do prefeito, não da câmara. Não precisa de aprovação dos vereadores para ser instituído, tanto que foi publicado no dia 12 de Maio e só entrou para apreciação do colegiado legislativo uma semana depois de já estar em vigor", declararam à equipe da Itapecuru Webtv.
Foi divulgado em redes sociais e veículos de comunicação local que o voto contrário dos vereadores impediria o município comprar medicamentos, equipamentos e contratar serviços para combater o coronavirus neste período de pandemia. Tentaram jogar a opinião pública contra os parlamentares e usar o fato politicamente, já que 2020 é ano de eleição. Surgiram até rumores em estampar na entrada da cidade um out door (cartaz gigante) com a fotos de cada um deles ao lado de frases negativas.
A recomendação expedida e publicada na sexta (29) pelo MPF-MA mostra que o voto foi correto e muito responsável, ao poder legislativo cabe apenas fiscalizar a aplicação dos recursos através da disponibilização imediata dos dados como reza a Lei de Acesso à Informação (Lei 12.527/2011). O objetivo da Procuradoria da República no Maranhão (PRM) é garantir transparência total a contratações e aquisições realizadas para enfrentamento da emergência em saúde pública decorrente do coronavirus expressa na Lei 13.979/2020.
Esta Lei Federal já prevê a dispensa de licitação para contratar e/ou adquirir bens e serviços no período da pandemia, regulamenta todo o processo. O MPF-MA recomenda que a dispensa do processo licitatório seja aplicada excepcionalmente nestes casos, não isentando o gestor de formalizar processo administrativo, autuado e devidamente justificado, que caracterize situação emergencial. Devem também constar, obrigatoriamente, prazo de execução e dotação.
A PRM em Balsas-MA notificou 26 municípios da região a atualizarem suas páginas eletrônicas, portais e sites na internet e neles apresentarem o Plano de Contingência Municipal (um plano de ação) acompanhado dos dados referentes às receitas e despesas aplicadas no combate à pandemia. Outra solicitação é que as prefeituras incluam de forma discriminada valores orçamentários recebidos e de execução de despesas, bem como especificações sobre contratos de prestação e fornecimento de bens e serviços. Para ler a íntegra da recomendação CLIQUE AQUI.
Na mesma sexta-feira (29) a câmara de Itapecuru aprovou Projeto de Lei n. 016/2020, de autoria da vereadora Thayse Mendes (MDB), que dispõe sobre a transparência na aplicação dos recursos destinados à prevenção, controle e execução de medidas durante a pandemia do covid-19 no município de Itapecuru Mirim.
Para os 26 municípios o MPF-MA recomendou ainda que publiquem em seus endereços eletrônicos informações sobre despesas e receitas relacionadas aos recursos federais recebidos, elaboração e apresentação do Plano de Contingência Municipal. Em caso de não atendimento das recomendações medidas judiciais e extrajudiciais cabíveis poderão ser tomadas.
PARA ENTENDER
DIFERENÇA ENTRE LEI E DECRETO (por Valdinar Monteiro de Saousa*)
No que concerne à lei e ao decreto, deve ficar claro que lei tem mais força normativa porque, para sua formação, concorrem conjuntamente o Poder Legislativo e o Poder Executivo. Aquele, formado por parlamentares, discute e aprova o projeto de lei, e este, encarnado pelo presidente da República, governador ou prefeito, mediante a sanção, transforma em lei o projeto de lei aprovado pelo Legislativo. O decreto tem menos força normativa (para garantia dos governados, assim deve ser visto) porque não passa pela discussão e aprovação legislativa, é simplesmente elaborado e assinado pelo presidente, governador ou prefeito, conforme o caso. O processo de formação da lei chama-se processo legislativo. O decreto não é submetido ao processo legislativo.
A mais importante, contudo, de todas as distinções entre a lei e o decreto é que a lei obriga a fazer ou deixar de fazer e o decreto, não. É o princípio genérico da legalidade, previsto expressamente no artigo 5.º, inciso II, da Constituição Federal, segundo o qual “ninguém será obrigado a fazer ou deixar alguma coisa senão em virtude de lei”. Somente a lei pode inovar o Direito, ou seja, criar, extinguir ou modificar direitos e obrigações. No atual regime constitucional brasileiro, não se obriga nem desobriga a ninguém por decreto, nem mesmo pelo doutrinariamente chamado decreto autônomo, cuja discussão não cabe aqui.
Dentre as funções do decreto, a principal é a de regulamentar a lei, ou seja, descer às minúcias necessárias de pontos específicos, criando os meios necessários para fiel execução da lei, sem, contudo, contrariar qualquer das disposições dela ou inovar o Direito. Contrariando (sem querer contrariar) os que não gostam de latim ou até o odeiam com ódio consumado: o decreto só poderá ser secundum legem ou, no máximo, praeter legem; jamais poderá ser contra legem.
*Valdemir Monteiro de Sousa é advogado (UFPA, 2002), especialista em Direito Administrativo (Gama Filho, 2013 e Direito Constitucional (USCS, 2015).
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